Há algo muito atraente na combinação entre vegetação exuberante e a aspereza do concreto aparente. É isso que se propõe a investigar o livro Concrete Jungle: Tropical architecture and its surprising origins, publicado pela editora alemã gestalten. A publicação traz uma leitura sobre "arquiteturas tropicais" modernas, apresentando casas situadas entre os trópicos de Câncer e Capricórnio e suas relações com seus meios culturais, construtivos e ambientais de origem. Mobiliza diversos projetos e arquitetos, num longo período de tempo que vai desde os anos de 1950 até os dias de hoje, traçando um panorama multifacetado que abrange construções residenciais localizadas em regiões tão distintas quando o Brasil, México, Índia e Quênia.
Concrete Jungle "é uma tentativa de entender as casas de concreto como mais do que apenas belos edifícios, mas como resultado de um fenômeno muito mais amplo". Inseridas em seus contextos políticos, econômicos e culturais específicos e plurais, muitas dessas arquiteturas também podem ser entendidas enquanto exemplos de reinterpretações e reelaborações de alguns cânones e parâmetros modernos, ao buscarem adaptar-se a seus meios e possibilidades e criar e estabelecer suas próprias narrativas, questionando um certo discurso de universalidade arquitetônica que atravessa o campo há décadas.
A partir de uma leitura essencialmente imagética e visual, complexificada por quatro ensaios textuais, o livro permite tecer relações e aproximações entre esses edifícios, muitas vezes temporal e espacialmente distantes, e, sem deixar de reconhecer as especificidades de cada projeto, ele ilumina muitas de suas características atemporais. A publicação põe em diálogo clássicos da arquitetura moderna como a Casa da Canoa, de Oscar Niemeyer, ou a Cuadra San Cristóbal, de Luis Barragán, com construções mais recentes como as casas de Marcio Kogan, do Studio MK27 e Angelo Bucci, do spbr arquitetos. Ademais, ela nos mostra como a tipologia residencial também figura enquanto um espaço de experimentação e de grandes possibilidades de criação e composição arquitetônica.
Para além de uma discussão ou tentativa de estabelecimento de um "estilo", a publicação busca expor a pluralidade de manifestações e elementos arquitetônicos empregados nessas residências que podem ser vistos enquanto potencialidades projetuais até os dias de hoje, sobretudo em suas relações com as características naturais próprias de seus sítios, como as climáticas e as geográficas, amplamente visualizadas através das fotografias do livro. Num cenário de crise climática e ambiental, esses elementos tornam-se ainda mais importantes para discussão e reafirmam a importância dessas construções enquanto possibilidades de referência para inúmeros projetos. O estudo e aproveitamento de parâmetros solares, topográficos, das vegetações e de materiais locais, se unem à tecnologias como o concreto armado para criar casas que dialogam com seus sítios de uma maneira única
Na Europa e nos Estados Unidos, os arquitetos trabalharam por muito tempo para controlar o meio natural, se isolando inverno cinza, severo e frio. Mas os arquitetos modernos nos climas mais quentes não tiveram escolha a não ser acomodar, como colocou o comitê do Pritzker em 2006, "a onipresença da natureza". Esses edifícios representavam não apenas uma nova ordem política, mas também um reconhecimento do lugar do homem na natureza, um ideal que é mais relevante hoje do que nunca. — Michael Snyder
Essas construções são capazes de contrastar, com a leveza de suas composições, a vivacidade das vegetações do entorno com a dureza do concreto aparente, integrando e criando uma relação harmônica entre dentro e fora, intervenção e pré-existência, arquitetura e natureza. Num momento de intensa urbanização global que, muitas vezes, ocorre em detrimento e prejuízo do meio natural, essas arquiteturas são um respiro e também uma possibilidade para seguir em frente.
Veja alguns dos projetos selecionados pela publicação: